Cuidados com a Saúde Mental na Gravidez

Quero começar esse texto propondo um pequeno exercício: qual a primeira imagem que vem a sua mente quando pensa em uma “mulher grávida”? Feche os olhos por alguns segundos e mentalize esta mulher. 

Eu posso quase adivinhar que, pelo menos 90% das pessoas, imaginam uma mulher entre 25 e 35 anos (no máximo), branca, bem vestida, corpo magro em que apenas a barriga aparece mais protuberante e redondinha, semblante sereno, com a mão na barriga demonstrando amor pelo bebê que ainda está em seu ventre. Adivinhei?

Pois bem, eu estou aqui para dizer que A Mulher Grávida não existe. Um tema muito debatido na Psicanálise e nos textos feministas, dos clássicos aos contemporâneos, é o que define uma mulher como mulher? A mulher padrão existe?

Há muitas controvérsias, mas fato é que quando falamos de mulher e de gravidez temos que dissolver os padrões para entender que o que existe é aquela mulher-específica-com-toda-sua-singularidade grávida. A Maria, a Amanda, a Carol, a Letícia, a Anne, a Paola, a Marcela, a Joana… grávida. Não é possível formar um grande bloco das grávidas pois cada uma vive em seu corpo e em sua mente uma experiência própria.

Uma análise um pouco mais atenta pode nos ajudar a perceber o quão complexo é este período de gestação e o quão longe daquela imagem idealizada ela pode estar. Pesquisas mostram que mais de 50% (isso mesmo, mais da metade!) das gestantes apresentam alterações emocionais importantes, um quarto das gestantes apresentam sintomas de depressão.

A gravidez já é considerada pela literatura especializada como um dos grandes períodos com potencial para crise emocional. Mas, vamos nos acalmar, isso é de certa forma, até esperado. Assim como as visíveis e rápidas mudanças no corpo, a mente da mulher grávida também precisa correr para se reorganizar diante a nova realidade que já está acontecendo e para o que está por vir. Se você conhece uma grávida, saiba que muito além do chá revelação e quartinho do bebê, ela precisa fazer um trabalho psíquico e emocional brusco e profundo sem, muitas vezes, ter clareza de tudo isso está ocorrendo dentro dela.

Por isso, certo grau de estresse e ansiedade são normais, porém devemos ficar atentos e cuidar para que esses sinais não fiquem muito elevados. Além do bem-estar da mulher, alterações emocionais podem afetar o desenvolvimento do feto, já existem estudos relacionando alto estresse e alta ansiedade com nascimentos prematuros e baixo peso.

 Se tudo isso é tão comum, por que não é falado de maneira mais aberta? Justamente, toda essa mitologia criada em torno da grávida plena e realizada torna-se uma cortina de fumaça para um cuidado fundamental nesta fase tão particular da vida, o cuidado também com a saúde mental.

Este, que pode ser considerado um dos momentos que mais precisamos estar atentas ao bem estar psicológico é silenciado por frases como “você não deveria se sentir assim, é até pecado” “nossa, nem parece que você está feliz” e por aí vai (me conta aqui nos comentários frases que você já ouviu para uma gestante). Precisamos permitir que a grávida expresse tudo que está sentindo de bom e de ruim, sem julgamentos, para acolhê-la e assim também acolher seu bebê.

Alto estresse, alta ansiedade ou sintomas de depressão na gravidez são fatores de risco para depressão pós-parto (DPP) ou, no mínimo, um babyblues mais pesado. Aliás, muito se fala em DPP, porém o que não se divulga é que a grande maioria dos casos, já seria possível identificar e tratar os sinais desde a gestação.

Por isso, o acompanhamento psicológico da gestante é FUNDAMENTAL. Não se refere apenas a tratar algo que não está bem, mas assim como no pré natal obstétrico, tem o objetivo de acompanhar para prevenir, identificar algo que pode estar passando sem o devido cuidado, orientar e acolher.

Esse tipo de acompanhamento específico deve ser realizado por um profissional da Psicologia que tenha experiencia em Psicologia Perinatal, mas o que é isso? Peri = em torno / Natal = Nascimento, então é a parte da psicologia que se dedica a estudar as questões e emoções em torno do nascimento: 
– Desejo ou não de ter filhos
– Tentativas
– Adoção
– Gravidez
– Parto
– Pós-Parto
– Lutos
– E outros..

Existem várias formas de se realizar esse acompanhamento: pode ser individual como uma psicoterapia propriamente dita, sem um prazo para terminar e com temas livres, de acordo com o que a gestante deseja falar; o pré natal psicológico individual com número de encontros já estabelecido (normalmente em torno de 10) e com temáticas específicas, ou o pré-natal psicológico em grupo. 

O importante é buscar um bom profissional e dar atenção à este momento. Ficou com alguma dúvida? Deixe nos comentários que ficarei feliz em responder.

Com carinho,

Thaís

Fatores de risco e fatores de proteção ao desenvolvimento infantil: uma revisão da área http://pepsic.bvsalud.org/pdf/tp/v13n2/v13n2a02.pdf

Maldonado, M. T. P. (2002). Psicologia da gravidez: parto e puerpério. (16ª ed.).  Petrópolis, RJ: Vozes. 229p 

SCHIAVO, R.A. Amamentação é para todos? reflexões atuais sobre encontros e desencontros na relação mãe-bebê. In: BATISTA, J.S; GUIDUGLI, S.N. Psicologia da saúde e clínica: reflexões necessárias. Curitiba: Apppris, 2019. 

Soifer, R. (1986). Psicologia da gravidez, parto e puerpério. (4a ed. I. V. de Carvalho, trad.). Porto Alegre: Artes Médicas. 124p 

Szejer, M. & Stewart, R.(2002). Nove meses na vida da mulher: uma aproximação psicanalítica da gravidez e do nascimento. 2a ed. (M. N. B. Benetti, trad.). São Paulo: Casa do Psicólogo. 322p. 

BADINTER, E. Um amor conquistado: o mito do amor materno. 2.ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.  

GUTMAN, L. A maternidade e o encontro com a própria sombra. 15.ed. Rio de Janeiro: BestSeller, 2019.  

MALDONADO, M.T; DICKSTEIN, J. Nós estamos grávidos. São Paulo: Integrare, 2010.  

SANTOS, M.F.S. Depressão pós-parto: validação da escala de Edimburgo em puérperas brasilienses. 1995. 119.f. Dissertação (Mestrado em psicologia) Instituto de Psicologia, UNB. Brasília 1995.

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