Disciplina Positiva é utopia?

A disciplina positiva funciona?
Ela nega a possibilidade dos pais falarem não para seus filhos? É muito permissiva?
É possível educar sem punições, gritos e ameaças?

Se você é mãe ou pai e busca estudar boas práticas parentais, com toda certeza, já se deparou com essa metodologia de criação de filhos.
Recentemente li o livro Disciplina Positiva para crianças de 3 a 6 anos: como criar filhos independentes e felizes e vou compartilhar aqui do que se trata e quais minhas impressões. Já fiz um vídeo falando sobre (veja abaixo, se inscreva no meu canal – que ainda é um bebê – e deixe seu like 😁), mas senti necessidade de aprofundar um pouco mais aqui no blog.

Escuto frequentemente, em minha clínica, mães angustiadas por não conseguirem se enquadrar nem enquadrar seus filhos nos diferentes manuais sobre-como-educar-uma-criança.
Essas falas, normalmente, vêm carregadas de sentimentos de culpa, sentimentos de incapacidade e frustração.

Além da curiosidade como psicanalista, existe também meu interesse pessoal como mãe de uma menininha muito sapeca de quase 4 anos que me coloca diariamente diante os maiores desafios da minha vida. Todo dia é uma maratona de negociações: para tomar o café da manhã, para sair de casa para escolinha, para tomar banho, para sair do banho, para pentear o cabelo, para dormir… UFA! Educar um ser humano não é tarefa nada fácil, tanto do ponto de vista braçal quanto emocional.

Melissa, 3 anos e 10 meses.

Por isso, conteúdos sobre parentalidade vêm ganhando espaço nas redes. Pais ansiosos em buscar uma solução para facilitar suas vidas. Muitas práticas chegam a propor atitudes opostas umas das outras, é fácil nos sentirmos perdidos.

A metodologia da Disciplina Positiva (D.P) propõe, sobretudo, o respeito às crianças. Eu sei, parece óbvio. Mas, fato é que na tentativa de ensinarmos o que consideramos positivo e reprimir o que avaliamos como ruim, muitas vezes, deixamos de observar como a criança está se sentindo.

Na D.P comportamentos inadequados não são ruins por si mesmos, eles apenas são a expressão de algo que a criança está sentindo e que, portanto, nossa função como pais seria o de interpretar o que está por trás daquela birra/agressividade/choro/inibição e etc e atender à essa demanda que pode ser: busca por conexão, aceitação, autonomia, encorajamento, dentre outros.

Achei isso muito interessante. Me lembrou meu próprio trabalho como psicanalista: em minha escuta clínica eu não julgo, não critico e nem tento fazer minhas analisandas mudar seus comportamentos. Isso não funcionaria. Mas, acolho e buscamos juntas trazer à superfície que sentimentos e ideias existem escondidos por trás de cada relato.

Encarar os “maus comportamentos” da criança desta forma, ajuda a termos mais paciência no dia a dia, pois saímos do lugar de controle para o lugar de compreensão. Eu sei, não é fácil lembrar disso na hora do caos, mas de modo geral, essa e outras informações presentes do livro podem sim nos dar alguns recursos para lidarmos com os momentos mais desafiadores.

Vale esclarecer que D.P não é sinônimo de permissividade. Não só pode-se, mas deve-se falar muitos “nãos”. A questão está na forma, com amor. Entender que firmeza não precisa ser agressiva nos leva a falar o não e acolher o choro que vem em decorrência dele, mas não ceder.

Agora, senta que lá vem polêmica: apesar de gostar e me identificar bastante da proposta, é impossível criarmos filhos sem punições, ameaças e gritos. E, esse pode ser um ponto problemático deste método, criar um ideal de parentalidade inatingível.

Veja bem, eu NÃO acredito que consigamos fugir totalmente dos “recursos tradicionais” porque as crianças precisariam disso para crescerem “bem educadas”, mas por que nós, cuidadores, somos humanos e nem sempre vamos estar dispostos, atentos, carinhosos. Somos nós que vamos acabar perdendo um pouco a paciência, subindo o tom de voz, fazendo ameaças e permutas para resolver logo uma situação.

Não, eu não sou a favor de punições, sou pelo carinho, apego e compreensão, mas sempre é bom lembrar que mãe não é uma santa beatificada e nem deve ser! Se – de modo geral – a agressividade não for a configuração diária da relação de vocês, todos ficarão bem.

O grande pediatra e psicanalista, Donald Winnicott, teorizou sobre a importância da Mãe Suficientemente Boa e não da mãe Perfeita. Caso esta existisse, nem faria bem ao seu filho. Nossas crianças precisam de pais carinhosos e humanos, não de perfeição. Nossas falhas são importantes!

Pra fechar, acho muito importante destacar que não existe manual para a maternidade. Como psicanalista, acredito que cada dupla mãe-filho é única, composta por pessoas com histórias de vida, personalidades e condições totalmente diferentes uma das outras.

Por isso, acredito que pegar um livro/manual e tentar seguir à risca todas as orientações sobre o que fazer com seu filho é sim utópico. Mais que isso, pode causar intenso sofrimento emocional, pois ao não conseguir se enquadrar (ninguém irá totalmente) no modelo você, como mãe, pode sentir-se incapaz, insuficiente, fraca e, ao não ver seu filho como aquela criança ideal do livro (ou das outras mães do instagram) pode achar que tem algo de errado com o seu. Tudo isso torna essa relação mãe-filho um tanto caótica e carregada de angústias.

Por isso, informe-se, mas com senso crítico. O melhor lugar parar buscar informações seguras sobre as necessidades do seu filho na própria relação entre vocês dois, é o observando e se observando.

Se você acha que estas reflexões te ajudaram ou podem ajudar outras mães a terem uma maternidade um pouco mais leve, compartilhe!

Com carinho ✨

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4 comentários

  1. Aguardando ansiosamente sua próxima leitura pois eu não teria paciência pra um livro pesado. 🥰

    1. Oi Isa! Pode deixar que, apesar de não conseguir ler muito rápido, vou sempre rascunhando minhas impressões por aqui!
      Ja me segue no insta? Lá vou postando as minhas leituras e aviso quando sai texto novo aqui do blog ♥️
      @thaisbecker.psi

  2. Apesar de já ser avó, me identifiquei muito com várias colocações suas e me reportei à criação dos meus filhos( hoje já homens) e concluí que já fazia uso da disciplina positiva, mesmo sem saber disso, rs.
    Me interessei pelo assunto pq, de alguma forma, participo da vida dos meus netos e quero saber a melhor forma de contribuir positivamente.
    Concordo que devemos saber dosar e usar os princípios da disciplina positiva dentro da nossa realidade, aplicando o que cabe melhor em cada situação.
    Devo confessar que o ❤️de avó é muito “mole” e procuro sempre ser empática e entender o motivo dos comportamentos deles.
    Muito obrigada por compartilhar conosco seu conhecimento e observações.

    1. Que bom que gostou, Silvania, fico feliz com seu comentário. Eu diria que não “apesar de já ser avó…” mas, justamente por já ser avó, tem toda a experiencia aí 🙂